JustPaste.it

Auriel

…E naquela noite chuvosa, em que o vento fazia a janela bater como se quisesse entrar, foi a vez da Lara.
 
Ela tinha sete anos, um dente mole e uma mania de esconder bilhetes debaixo do travesseiro. A mãe dizia que era pra fada do dente, mas Lara jurava que era pro “Senhor do Sonho”, uma ideia que ela mesma inventou. Mas, naquela noite, nem fada nem sonho: quem apareceu foi ele, o ursinho voador, empurrado pela fresta da janela mal fechada e guiado pelo barulho do coração da menina — um som baixinho de saudade.
 
Ele pousou bem devagar no criado-mudo, balançando as asinhas com um esforço fofo e barulhento. Lara abriu os olhos no susto, mas não gritou. Reconheceu na hora aquele cheiro de guardado, de algodão velho, e um calor no peito que ela não sentia desde que perdeu o coelhinho de pelúcia no parque.
 
— Você… veio por ele? — sussurrou.
O urso não falava, claro. Só balançou a cabeça devagar, como quem diz “mais ou menos”. Porque ele nunca ia por um brinquedo só. Ele ia pelos buracos invisíveis que esses sumiços deixavam. E o da Lara era grande.
 
Sem pensar muito, ela se encolheu e fez espaço na cama. O urso subiu com esforço, deitou ao lado dela e ficou ali, só… sendo. Sendo calor. Sendo presença. Sendo colo.
 
E quando ela finalmente dormiu, ele fechou os olhinhos costurados, abriu as asas e voou de volta pro sótão.
 
Mas deixou no travesseiro um bilhete meio torto escrito com lápis roxo:
 
“Quando a saudade apertar, deixa a janela entreaberta.”