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Eu tinha 11 anos quando Jade me derrubou da árvore. Eram férias de verão, minha família me levou para uma casa no interior que ficava em um campo no centro de uma floresta medonha. Durante a noite, entre o som do vento chocando-se contra as folhas das árvores, eu podia ouvir a floresta agonizar, gritar e chorar. Mamãe e papai diziam que isso só acontecia por que eu não tomava direito os remédios. Quando Jade surgiu do meio das árvores em uma tarde ensolarada, fiquei feliz por encontrar outra criança após tanto tempo. Durante dias foi tão divertido. Nós rolávamos na grama, corríamos atrás de insetos e competíamos para ver quem jogava pedrinhas mais longe. Mamãe e papai ficavam na janela de casa nos olhando brincar do lado de fora, em seus rostos havia desaprovação e preocupação. Eles não gostavam de minha amizade com Jade, todos os dias pediam para que eu parasse de brincar com ela, mas eu os ignorava. Bem, isso foi até aquela tarde. Quando Jade sugeriu que fossemos até um pouco mais longe na floresta. Depois, subimos em uma árvore e, de lá, Jade me empurrou. Eu não sei se foi brincando ou não, mas quando recuperei a consciência, já de volta em minha cama, eu fui dominada por um ódio que nunca senti antes. Agora, eu odiava Jade, embora não conseguisse entender de onde isso estava vindo. Era intenso, não era meu! Só podia ser coisa daquela floresta amaldiçoada. Conforme eu pensava nisso, sentia mais e mais ódio. Minha cabeça estava dolorida e havia um curativo em minha testa.

Cecilia, precisamos conversar! Mamãe disse sentando-se ao meu lado na cama. Nós toleramos isso, pois você é criança e estava se divertindo, mas, agora, estou preocupada, pois isso está indo longe demais. Dessa vez foi só um tombo, mas você poderia ter se machucado ou se perdido sozinha na floresta.

 

Eu sabia onde ela queria chegar.

 

— Você está grandinha demais para ficar com esse negócio de amigos imaginários. — Papai entrou no quarto e completou mamãe. — Jade não existe, e está na hora de você colocar um fim nisso. Se parar de imaginar Jade, prometo que voltaremos pra

nossa cidade daqui a 1 semana, que tal? Não está com saudades de casa?

 

Eu estava. Muito. E estava com raiva de Jade. Eu precisava pôr um fim nisso tudo, e nela. Enquanto caminhava em direção ao ponto perto da floresta onde nos encontrávamos todos os dias, eu pensava em como mandar Jade para longe da minha imaginação. Mandá-la embora só iria atrair mais ela, simplesmente "parar de imaginar" não era uma opção. Uma vez, mamãe ensinou a escrever os sentimentos negativos em um papel e, depois, rasgar e imaginar os sentimentos ruins desaparecendo. Eu deveria rasgar Jade!

Lá estava ela encostada no tronco de sempre, parecia envergonhada ou arrependida. Dei a volta antes que ela me notasse e a peguei pelas costas. Acertei sua cabeça com uma mesma pedra, uma, cinco, dez, talvez mais de 20 vezes. Jade gritava, mas ninguém além de mim podia ouvir. Então, depois de um tempo, silêncio. Jade estava fora da minha imaginação, ela já não existia mais.

 

Voltei para casa e me deitei, estava com as pálpebras pesando de cansaço. Acordei algumas horas depois com o sol passando por uma fresta na janela e acertando meu rosto. Cocei os olhos, sentindo uma textura estranha em minhas mãos e rosto, além de um cheiro metálico esquisito. Me sentei e aguardei meus olhos se acostumarem com a claridade. Meu pijama branco estava tingido de um vermelho mais forte do que a minha mente podia ser.

 

— Mamãe? Papai? — Chamei mais de uma vez. Mas ninguém veio. Me levantei lentamente e fui até a sala, a TV ainda estava ligada no Jornal da Tarde. Cocei meus olhos mais uma vez para ler a manchete anunciada.

 

"Corpo de menina de 10 anos é encontrado em floresta. Jade Norman estava desaparecida desde o final da tarde de ontem."

 

No mesmo momento, ouvi um barulho na porta de entrada, ao que apareceram cinco adultos bem vestidos que me levaram para um lugar distante. No caminho, me perguntavam coisas sobre a minha vida. Nome, idade, bichinhos de estimação, papai e mamãe e sobre a floresta. Eu respondia tudo, ainda confusa e exausta. Chegamos e fui posicionada em uma sala de cores claras, onde outros adultos vieram e me fizeram perguntas estranhas sobre Jade por várias horas.

 

Em um momento, já entediada, eu disse: — Eu estava me sentindo sozinha durante as férias, pois não dava para brincar com o papai e a mamãe o tempo todo. Então eu inventei Jade na minha cabeça para brincar comigo, Jade não existe mais. Eu parei de imaginá-la agora.

Os adultos vestidos de branco se encararam por alguns segundos até uma delas voltar seu olhar forçadamente bondoso para meu rosto e acariciar meu cabelo dizendo: Jade era real, meu bem. Já papai e mamãe, estão mortos há mais de 2 anos.

- yunki